segunda-feira, 18 de julho de 2011

A Tributação no setor florestal e o princípio do “protetor-recebedor”

Rafael Antonietti Matthes
Advogado atuante na área de Direito Ambiental. Mestrando em Direito Ambiental pela Universidade Católica de Santos. Pós-graduado em Direito Tributário pela Rede LFG e pós-graduando em Direito Internacional pela PUC/SP. Membro da Comissão dos Novos Advogados do IASP.

Em tempos de guerra cambial e de concorrência desleal na esfera internacional, a proteção da indústria e das empresas nacionais se mostra como um instrumento econômico de suma importância.

Discute-se muito de que forma os governos podem agir no sentido de reduzir os custos da produção nacional, para que o preço estipulado ao consumidor final seja competitivo com os preços praticados no mercado internacional.

Uma ideia surge, então, como uma luva: por que não subsidiar a aplicação dos incentivos fiscais às empresas que colaboram com a proteção ambiental?

É nessa linha que devem ser aplicados os ditames do já consagrado princípio do “protetor-recebedor”, antítese fática do princípio do poluidor-pagador, por meio do qual aquele que poluir deve arcar com os custos pertinentes às medidas preventivas e de combate à poluição.

Assim, nos termos do princípio do “protetor-recebedor”, os entes federativos podem desonerar os setores comercias do pagamento de certos tributos, como no caso do chamado “Proambiente”, Programa de Desenvolvimento Sócioambiental de Produção Familiar Rural vinculado à Secretaria de Desenvolvimento Sustentável do Ministério do Meio Ambiente, que tem por finalidade compensar os serviços ambientais prestados pelos agricultores familiares à sociedade brasileira e internacional.

Por que, então, não falar em um programa estadual que desonere ou diminua a alíquota ICMS incidente sobre as empresas de celulose e papel, na região do Estado do Mato Grosso do Sul, com vistas a incentivá-las a protegerem o meio ambiente?

Além de proteger o meio ambiente, o que, nos termos do artigo 225 da Constituição Federal, é dever de todos, o Estado do Mato Grosso do Sul estaria protegendo as empresas situadas nessa região, oferecendo um custo menor a sua produção e, consequentemente, um preço final mais competitivo.

sexta-feira, 8 de julho de 2011

Programa Minha Casa Minha Vida e a nova usucapião

por Rogério Lauria Marçal Tucci
Membro da Comissão de Novos Advogados do IASP

Foi publicada no DOU a Lei Ordinária nº 12.424 em 16.06.2011. Conforme o que se viu nos jornais ultimamente, trata-se da implementação da 2ª fase do Programa Minha Casa Minha Vida. Desta vez, há recursos da ordem de R$ 125,7 bilhões até 2014 advindos do FGTS e do Orçamento-Geral da União, para mais de 2 milhões de moradias, o dobro de casas e apartamentos financiados na 1ª fase do Programa, iniciada em 2009.

Até os mais céticos não devem discordar que, de fato, o programa já é o de maior sucesso na história recente do nosso país. Para o Presidente do Conselho Consultivo do SECOVI-SP, Romeu Chap Chap, “O Minha Casa, Minha Vida se consolida como o maior e mais consistente programa de habitação de interesse social dos últimos tempos e merece ser adotado como uma verdadeira política nacional (apartidária)” . Não há dúvidas quanto ao êxito do programa e a nova empreitada conta com interessantes novidades, abarcando mais famílias de baixa renda e aumentando a faixa de atendimento à classe média, já metade da população do país. Constata-se, ainda, a introdução de modificações nas próprias moradias, com aumento de espaço interno e melhor acabamento, como azulejos na cozinha e nos banheiros, o que antes não ocorria.

A Lei 12.424/11 altera uma série de dispositivos legais, com o evidente escopo de tutelar o direito social constitucional à moradia, principalmente o das pessoas de baixa renda. Sofrem alterações, por exemplo, a Lei dos Registros Públicos; a Lei de Incorporação Imobiliária; e também o Código Civil.

Quanto ao Código Civil, é necessária maior reflexão sobre o espectro das disposições introduzidas pela Lei 12.424/11. A primeira delas cuida da dispensa de outorga marital, nos contratos em que o “beneficiário final seja mulher chefe de família, com renda familiar mensal inferior a R$ 1.395,00”. A outra insere no Código Civil novo dispositivo, o art. 1.240-A com a seguinte redação:


“Art. 1.240-A. Aquele que exercer, por 2 (dois) anos ininterruptamente e sem oposição, posse direta, com exclusividade, sobre imóvel urbano de até 250m² (duzentos e cinquenta metros quadrados) cuja propriedade divida com ex-cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar, utilizando-o para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio integral, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.
§ 1o O direito previsto no caput não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez.
§ 2o (VETADO)”

O parágrafo 2º, sobre isenção fiscal sobre emolumentos do registrador para aqueles considerados judicialmente hipossuficientes, foi vetado, sendo que na mensagem de veto constou a violação de competência tributária dos Estados (art. 236, §2º, da CF).

Sobre a dispensa da outorga marital, há louvável prestígio a um direito social (art. 6º da CF) em detrimento dos danos que venham a ser causados ao marido. O dispositivo assegura que havendo prejuízo, poderá haver resolução em perdas e danos. Regra, por certo, desnecessária. Em um sistema onde prevalece a reparação integral, obviamente, se houver prejuízo, haverá possibilidade de reparação.

Em princípio, o dispositivo facilita o financiamento para garantir, de maneira célere, o direito a moradia, já que uma demanda judicial para suprir a outorga marital poderia ocasionar danos imensos a uma mulher chefe de família, com renda familiar mensal inferior a R$ 1.395,00. Merece aplausos a iniciativa do legislador, com a ressalva de que não havia a necessidade de só a mulher constar no dispositivo. A norma poderia tratar da outorga conjugal e não só da outorga marital.

A segunda remissão, no entanto, é deveras impactante e certamente gerará interessantíssimo debate doutrinário, pois cria nova modalidade de usucapião.

Nos últimos tempos, este instituto não gerava amplas discussões. Em breve, contudo, inevitavelmente a usucapião voltará à tona em meio ao intenso debate sobre a nova modalidade, “usucapião especialíssimo urbano“; “usucapião do ex”; “usucapião por abandono de lar”, ou qualquer outro nomen iuris que se possa dar ao novo instituto.

É curioso perceber que na mesma medida em que a usucapião especial urbana pretende proteger a entidade familiar (“utilizando-a para sua moradia ou de sua família”), o novo instituto impõe verdadeira sanção àquele que abandona o lar, imiscuindo o direito de propriedade com o (suposto) descumprimento de dever conjugal. Em última análise, não se está tutelando os direitos de moradia da família de baixa renda, mas apenas concedendo uma facilidade ao cônjuge/companheiro abandonado...

A mens legis por trás deste dispositivo é nebulosa, não sendo claro o que ou quem o legislador quis proteger, ou, ainda, quais serão as conseqüências dessa novidade legislativa.

Aguardemos o novo debate!